sábado, janeiro 24, 2004

Radicalismos na questão da Queima

Parece-me extremamente redutor que estudantes universitários de Coimbra olhem para a Queima das Fitas só como as noites do parque (posição compreensivel para quem é de fora e só pretende assistir a alguns concertos); parece-me absurdo que os governantes de amanhã, que são hoje estudantes universitários, só imaginem como forma de luta a suspensão de algo que é muito querido à cidade, universidade e academia; parece-me lógico que os mesmos que propuseram a suspensão da Queima das Fitas, quer a proposta fosse ou não aprovada, em Magna ou Magna de Voto, estão-se nas tintas para o que os colegas votam e vão agir sozinhos, da mesma forma que uns quantos e corajosos pulhas (para não chamar outra coisa) fizeram no passado encerramento, correndo todas as portas da universidade a cadeados e inutilizando as fechaduras com pregos; parece-me que o vaticínio do dux-veteranorum e outros de que esta proposta iria dividir a Academia em vez de a juntar...

Visto isto de fora, e imparcialmente, é assim que as coisas acontecem, na academia ou no país. A nossa democracia ainda tem fundações frágeis porque não se respeita a vontade contrária à nossa, e age-se sozinho. Fico pasmo quando me dizem que a ÚNICA forma de luta por um melhor ensino superior é a suspensão da Queima das Fitas; como anteriormente disseram que a melhor forma de luta era encerrar a cadeado...

Receio qual a ideia iluminada que possa surgir a seguir e custa-me reproduzir aqui alguns absurdos extremos porque acho que os iluminados podem achar boas ideias: barricadas nas ruas de Coimbra, assaltos a governos civis, "kalea borroka" ao estilo Euskadi.

Pensemos bem, como pessoas cultas e inteligentes que somos (ou deveriamos ser, ou pelo menos parecê-lo) na nossa responsabilidade na sociedade, no presente como estudantes universitários, no futuro como governantes ou figuras de topo
no país, quiçá na Europa.

A Queima das Fitas é um evento que pode assumir multiplas formas, desde o cortejo que é a manifestação estudantil mais acarinhada pela cidade e arredores, onde prima a irreverência, ultimamente vocacionada para o álcool mas que poderá ser este ano vocacionada para a mudança de mentalidades e protestos - afinal assistem milhares de pessoas nas ruas, as mesmas que nos acusam de ser bêbedos; as noites do Parque, a realizarem-se, podem ter outro conceito, como uma mostra das várias secções, como já tantas vezes foi deliberado em Assembleia Magna e, curiosamente, é uma das deliberações entre muitas que não tem sido obrigatório cumprir (nem surgem ameaças a quem não cumpre).

Faz parte também da responsabilidade civil virar as nossas armas argumentativas para o Estado, alertando pelo meio a população, que os estudantes são acusados de custar tanto ao estado, mas que as obras públicas - TODAS - duplicam ou triplicam o seu preço, tornando o que cada estudante custa ao Estado uma
gotinha no oceano, e que mais tarde dará o seu retorno, ao contrário das obras públicas que necessitam de manutenções e outros gastos.

Cabe a nós usar o que temos à disposição para "lutar", sabendo que esta luta pode ser argumentativa e não real, deve ser civilizada e aberta para dar o exemplo.

(Texto escrito para a "Opinião do Leitor", em www.acabra.net)

Paulo Aroso Campos - paulo.aroso@zmail.pt