segunda-feira, novembro 15, 2004


Opinião de um prof...
da Universidade Técnica de Lisboa sobre um determinado anuncio de cerveja
(Jornal Publico, sexta-feira 12 de Dezembro 2004)

Nesse artigo, esse senhor mostrava-se muito indignado com o teor do anúncio porque, supostamente, este anuncio era ofensivo para os cidadãos deficientes. Argumenta, a propósito de um dos videos e outdoors sobre uma anedota em que a criança é uma orelha. É claro que é somente a opinião deste senhor, professor universitário, que está aqui a ser apresentada. Não tenho nada contra esta opinião e respeito-a, no entanto surgem-me algumas duvidas acerca da motivação da sua opinião. Pelo que ele diz: "Para isso, (comparação da cor da cerveja com o humor negro) conta, entre outras, a história da notícia do nascimento de uma criança com deficiência, sem membros, e reduzida a uma orelha surda. E faz piada disto e quer ganhar dinheiro com isto, motivando-nos para beber a cerveja negra como o humor da campanha". Não compreendo esta primeira indignação: afinal não é o objectivo da maioria das anedotas a ridicularização para, daí, retirar a graça? Quantas piadas há com alentejanos em que eles são continuamente ridicularizados. Além do mais: já alguma vez se viu uma criança que nasce só sobre a forma de orelha? Como é que vivia, se isso acontecesse? Não seria um nado morto?

Para este senhor não. Porque o problema dele, professor universitário, não é com a cerveja, mas sim com os cidadãos deficientes. Reparem: "Sabemos que a forma como as pessoas com deficiência são consideradas depende da construção social que fazemos à volta da sua condição. Vemo-las como autónomas? Vemo-las como dependentes? A deficiência é, antes de mais, uma construção social. E se assim é, qual é o contributo que esta campanha publicitária dá para um entendimento solidário de um cidadão com deficiencia? Nenhum, porque a piada são as proprias pessoas com deficiencia, e o riso é suscitado pela exibição das suas deficiencias...". Ele vê as pessoas deficientes como diferentes e a deficiencia como uma construção social. Até chegar ao ponto de ficar ofendido com o absurdo de uma anedota em que uma criança é uma orelha, e ficar ofendido porque isso avilta os deficientes coitadinhos! Será que uma pessoa cega ficaria com raiva da anedota se em vez de orelha surda a criança nascesse como um olho cego?

Como diz na campanha, a cerveja, tal como o humor negro, são para uma minoria; quem não gosta não é obrigado nem a beber nem a ouvir. Tal como as várias definições de deficiencia e racismo. Para mim custa-me que um professor universitário seja tão diminuido de visão porque, certamente durante o seu dia a dia, lidará com jovens completamente diferentes. A deficiencia, tal como o racismo - e como eu os entendo - é a forma como olhamos e apontamos as diferenças dos outros, porque todos temos diferenças, todos temos lacunas: sejam sociais, económicas, fisicas. O que nos aproxima é sabermos perceber as diferenças e podermos tratar todos por iguais, sejam eles professores universitários, sejam eles uma orelha surda.

Afinal os "Malucos do Riso" e os "Batanetes" não adaptam anedotas para poderem também vender o seu produto (audiencias)? E não é muito mais ofensivo uma hora de lavagem cerebral batanete ou maluca do riso do que uma cerveja geladinha? E um prato de tremoços para a mesa do canto!

Paulo Aroso Campos - paulo.aroso@zmail.pt

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